quarta-feira, 27 de março de 2019

Guaiamum

(em homenagem a Ailnton P. S.)


Meu padrasto, um baiano. 
Ainda muito jovem conheceu a dor da perda, a fome e a miséria.
E, como muitos outros nodertinos, fugindo delas embarcou num onibus para São Paulo.
Então, promessa de riqueza e prosperidade.
Alguma chance. 
Alguma oportunidade...

Como outros antes e depois dele.
A seduziu. 
A esperança de dias melhores ou mormente a fulga do sofrimento, não se sabe. 

Porém, Baiano coservou sua essência.
Cultivou-a, viveu-a sempre,
A bem da verdade.
Assim, trazia consigo em seu corpo, em sua alma, 
Em seu ente mais profundo uma bahianidade. 
Dado a fazer “baianices” boas...

Dia desses, cismou de caçar caranguejos no pequeno mangue, 
Do pequeno rio, 
Da nossa pequena cidade.
Por sorte ou destino deparou-se com um guaiamum dos grandes.
O bicho era branco e azulzinho, da cor do céu, da cor do mar.
Encantou-se imediatamente;
Engraçou-se verdadeiramente pelo bicho.

Viu nele tanta beleza que decidiu:
_ Bicho desses n'um pode morrer! 

Resolveu que iria criar o crustáceo.

Em casa.

Lá no fundo do quintal, 
dava todos os dias atenção e alfaces ao danado 
que carangueijava por todo o terreiro.
O bicho comia mesmo, comia de se enfartar.
Baiano, em sua singeleza, certo dia ponderou: 
_ o danado precisa d'um nome! 
E, de nome, deu-lhe ‘Guaiamum’.
Afinal, _ 'é arrimo de família'. Se ria e justificava ele.

Guaiamum, no entanto, não viveu muito; 
distante que estava de seu habitat natural.

Certo dia, Baiano deparou-se com o bicho morto lá no quintal. 
Entristeceu-se verdadeiramente...

Nos cortes ainda rasos de seu semblante percebia-se um pesar profundo... 
Dava dó até de oiá...

Acabrunhado, enterrou o bicho no pomar 
E, pôs-se a ruminar sobre brevidade da vida e a ligeireza da morte...

Baiano um dia enfastiou-se da vida também.

E, hoje, cá estou eu a ruminar...


domingo, 3 de março de 2019

Pondé o ressentido

Ler ou ver Luiz Felipe Pondé “o filósofo” falando sobre filosofia ou política por vezes é semelhante a assistir nos dias atuais um enterro seguido por um cortejo carpideiras. É tão inveraz que às vezes se ri, às vezes se chora.

Raro é vê-lo produzir pensamento no sentido da expressão de alguma originalidade, no sentido da expressão de seu “gênio”. Mesmo assim ora ou outra se aventura em tais tarefas, é neste momento que deparamos com um pensamento opaco, impenetrável ao entendimento e a reflexão.

Em seu discurso, por exemplo, o tema capitalismo converte-se numa doutrina de fé. Em geral não progride, como num argumentum ad nauseam, apenas repete-se cansativamente, uma ladainha fatigante, tétrica que emula de forma enviesada o mito do “eterno retorno do mesmo”. Quando não implica simplesmente em puro niilismo estéril, labirintos, círculos viciosos, antinomias.

No mais das vezes, suas ponderações são sempre paradoxalmente reativas: reclama de pegar pouca mulher, enquanto seus adversários pegam as melhores e mais divertidas. Reclama, reclama, reclama...

Ou seja, a expressão de sua “potência de ser” não consiste na expressão de sua individualidade, de sua singularidade; mas numa reação despeitada diante do mundo como ele inexoravelmente é ou esta.

Isso ocorre porque como poucos na história da filosofia, provavelmente ele tenha se especializado na arte do blá blá blá. Contudo, não seria exagero afirmar que nele esta arte tenha alcançado um alto nível de "sofisticação".