quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

Há coisas que ainda precisamos "esclarecer"


A sociedade tecnológica instrumentalizou a razão e, como consequência estabeleceu um status quo, cabe a filosofia denuncia-lo na medida em que reconstrói o sentido da categoria do "esclarecimento".
Noutro dia lendo os comentários jornalísticos (diga-se de passagem da PIG) sobre a pretensão do governo federal de criar um centro de formação online para o trabalhador, cuja a finalidade, entre outras, seria promover a formação critico-politica do trabalhador, pude mais uma vez evidenciar o movimento daqueles se opõem claramente a emancipação intelectual e politica dos trabalhadores em nosso país.
Um dos críticos do programa alegava que o trabalhador não necessita ter formação politica, precisa somente dominar os métodos, técnicas e tecnologias para que o país alcance seu melhor nível de desenvolvimento e possa assim fazer frente a concorrência do mercado internacional.

Crítica de fundo evidentemente capitalista ou em nosso caso pré-burguesa, diga-se de passagem, dado que desconsidera de forma absoluta as consequências de um mundo meramente pautado pela produção/reprodução, consumo e pela desumana e anti-ambiental concorrência.

Também ignora e nega a possibilidade de emancipação ou de "esclarecimento" do homem, do trabalhador; aspecto que expõe o caráter oligárquico do patrimonialismo nacional.

Por mais que os modernos críticos do socialismo ou do marxismo torçam o nariz em admitir, este fato evidencia claramente o antagonismo que pauta as relações socais, e, mais precisamente, as relações de produção e trabalho em terras brasileiras. É bem provável que tenham razão ao afirmar que nossas relações deem-se sob o signo de outras categorias, admitamos que seja; no entanto, exageram em negar o caráter conflitante dos interesses que opõe diferentes estratos sociais.

Este fenômeno lamentavelmente arraigado na cultura oligárquica nacional, também é denunciado de forma documental pelo jornalista Laurentino Gomes, em seus três celebradíssimos compêndios de História do Brasil.


Denunciamos então que, relegar a educação e a formação do homem à uma instrução puramente tecnológica engendra não autonomia, mas, sobre tudo, a "automatia", nadificação, ou, noutras palavras, a formação de sujeitos padronizados para a submissão. Isto porque, a razão que fundamenta toda educação tecnológica esta doente, e sua doença, como afirma Horkheimer, "reside sobre o fato de que ela nasceu da necessidade de dominar a natureza". A sociedade tecnologia é a sociedade na qual o projeto de dominação da natureza, e, consequentemente do próprio homem foi ou é efetivamente realizado.

Para concluirmos esse breve comentário é conveniente lembrar que também o filósofo Nietzsche, em sua critica da civilização ocidental, denunciou o fato de a razão, um dos elementos que compõe a complexidade da realidade humana, estar a serviço da própria razão quando deveria estar a serviço da vida.

Essa polêmica coincidiu também com uma releitura que iniciei do Livro de Adorno e Horkheimer, Dialética do esclarecimento. É interessante observar a atualidade de um texto como esse:

"A disposição enigmática das massas educadas tecnologicamente a deixar dominar-se pelo fascínio de um despotismo qualquer, sua afinidade autodestrutiva com a paranoia racista, todo esse absurdo incompreendido manifesta a fraqueza do poder de compreensão do pensamento teórico atual."








sábado, 7 de dezembro de 2013

Vale tudo para salvar o ano

Fim de semestre é sempre igual, os alunos que passaram o ano todo sem fazer nada; ou mesmo aqueles que sequer frequentaram a escola aparecem para tentar dar um “golpe final” e salvar o ano.
Para se dar bem nessa, digamos, ‘manobra’ lançam mão dos mais extraordinários artifícios.
Eis que estou eu sentado em minha cadeira corrigindo algumas atividades e, de repente, me aparece uma aluna, literalmente do nada, visto que já não vinha à escola há mais de três meses, e pergunta:
_ Professor será que eu ainda tenho chances de passar de ano, eu fiquei quatro meses sem vir pra escola?
Eu: Veja bem minha querida, o problema é que de um total de 40 aulas você só compareceu duas, que são justamente as de hoje.
Ela então franziu a testa e num tom profundamente dramático anunciou:
_ Foi um caso de câncer professor!!!
Eu imediatamente tomado pela empatia expresso minha preocupação: Nossa minha querida, que terrível! Mas quem teve ou esta com câncer, sua mãe, sua avó ou outro alguém da família?
Ela então responde num tom ainda mais dramático, quase que teatral:
_ Não professor! Não foi nenhum parente, fui eu mesma!
Eu então dou aquela olhada clinica “mais cuidadosa” para moça a fim de encontrar resquícios de uma doença tão terrível, - sem êxito na verificação superficial exclamo:
_ Que coisa lamentável moça! Mas quando foi? Você ainda esta em tratamento? Esta fazendo quimioterapia?
Ela: Quimio.. o que professor?
Eu: quimioterapia ou radioterapia?
Ela: Não, era outro tipo de tratamento!
Eu curioso e desorientado então pergunto: afinal, que tipo de câncer você teve minha querida?
Ela: eu tive um "BIOMA NO ÚTERO...".
Eu: você teve o que?
Ela: UM "BIOMA NO ÚTERO..." (tom de dramaticidade enfatizado)

_ Imagens que solaparam imediatamente os meus pensamentos: Caatinga, Serrado, Mata Atlântica, Tundra...

Pensei comigo mesmo... depois de ter visto Claudia Ohana nua na Play Boy nos anos 80, nunca imaginei que fosse encontrar novamente uma mulher com um BIOMA NA VAGINA.


sexta-feira, 25 de outubro de 2013

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Don't Let Me Be misunderstood.

La no recôndito da radical raiz

Ou na flor da fina pele

Mama eu ouço, somente tua voz

Negra, guerreira, rainha grave

Olha os pelos arrepiados

Minha pele também é tambor

Couro curtido ao Sol das estepes

Vibra grave um tímpano

Enquanto o outro se desfaz....

Don't let me be misunderstood

sábado, 24 de agosto de 2013

Um beijo em duas faces

Como tu bem sabes...
Os olhos são portas, estradas para um sertão...

La, bem no fundo
Da tua boca dissimulas tua língua, delicada, afiada

Ai, ai de mim...

Cada pinta em tua face é uma pista,
Num quadro des-ilusão.

Só...

Quê frieza a tua mão revela?
Onde está teu sangue?
Na cabeça ou no coração?

Teu caminhar só por entre as gentes engana a solidão?
Teu rumo tem destino certo.

Finges-te de Alice, mas sois avessa a loucura.
Temes a perdição...

No fundo da toca te des-cobres.
Do outro lado do espelho tudo se inverte.
Beijas a outra face.

Teus olhos desencontram
Tua boca seca

No fundo tu caminhas triste.


sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Sobre encontros, tequilas e amnésias


Diz a lenda que em algumas pessoas o porre de Tequila causa amnésia.
Certo dia, um casal de amantes marcou um encontro regado a muita, mas muita, Tequila.
Bem, dizem que a arte imita a vida, neste caso, extraordinariamente, sucedeu como na lenda. No dia seguinte, ambos acordaram em suas respectivas casa, porém sem a menor lembrança do que havia lhes ocorrido na noite anterior.
Em função do esquecimento, repetiram seus encontros por um sem-número de vezes...
Os detalhes!
Ah... os detalhes desses encontros...
No íntimo de cada um dos amantes, restava uma vaga lembrança: a sensação intuitiva dos detalhes, dos muitos detalhes...
Mas as circunstâncias da vida são tantas... e, entre encontros e desencontros, perderam-se pelo mundo.
Enfim, os amantes, pseudo casal, tomaram em suas vidas rumos diferentes...
Um foi para o norte o outro para o sul – coisas que acontecem na vida das pessoas.
Apesar de passado muito tempo, sentiam inusitadamente uma imensa vontade de se embriagar; sentiam uma falta, um vazio, sabe-se lá de que...
O fato é que os porres de tequila, agora sós, apenas lhes causavam substanciosas ressacas, tremendas dores de cabeça. No fundo, permanecia aquela mesma sensação de vazio, de ausência.
Depois de muito ponderarem a respeito de suas profundas angustias, sobre a terrível sensação de ausência que lhes oprimia, resolveram novamente se encontrar...
Então, aquele que havia ido para o norte, retornou. Assim como o amante que havia ido para o sul.
O reencontro ocorreu no mesmo horário e no mesmo local em que durante anos se encontravam.
Finalmente voltaram a se encontrar!
Ambos confidenciaram sobre suas profundas angustias; as lancinantes sensações de ausência que sentiram.
Discutiram sobre a hipótese da amnésia provocada pelos porres de tequila e admitiram sua possível factibilidade.
Puseram-se então a recapitular em suas memórias cada passo de seus encontros passados. Cada gesto foi, meticulosamente, retomado pelas parcas memórias de cada um.
De repente, como um grande quebra cabeças, tudo foi se desvelando diante de suas consciências.
O que em princípio parecia uma enorme colcha de retalhos foi se revelando um belo tecido, rico de detalhes. Cada redescoberta era motivo de grande alegria para ambos.
Em dado momento, todo o ritual dos encontros passados havia sido refeito.
Momento que lhes ocorreu a grande iluminação...
Como de súbito, toda aquela sensação de angustia, de vazio, havia sido finalmente preenchida pelos vários fragmentos de uma memória compartilhada e que lhes reconstruiria todo o sentido, que lhes refaria todas os brancos das longas noites de embriagues alone.
Faltava em suas tequilas...
O sal e o limão.


By: Jairo de Sousa Melo

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Popper e o caráter hipotético do conhecimento científico


Popper e o caráter hipotético do conhecimento científico

“Acredito que valeria a pena tentar aprender algo sobre o mundo, mesmo que, ao fazé-lo, descobríssemos apenas que não sabemos muita coisa. Esse estado de ignorância conhecida poderia ajudar-nos, em muitas das nossas dificuldades. Vale a pena lembrar que, embora haja uma vasta diferença entre nós no que respeita aos fragmentos que conhecemos, somos todos iguais no infinito da nossa ignorância.”[1] Karl Popper


Além de oferecer mais conhecimento sobre a realidade, a ciência tem propiciado o desenvolvimento tecnológico e a produção de equipamentos que facilitam o modo de vida humano. Isso porque corresponde à vontade humana de saber cada vez mais sobre o mundo. Sendo assim, ciência sempre existiu. Mas, sua definição e consequente modo de produção de conhecimento passaram por muitas variações.

Diante da diversidade de teorias, aquela que é aceita costuma apresentar vantagens sobre as demais concorrentes. O problema então é: qual teoria científica deve ser escolhida? Como escolher?

Karl Popper apresentou um critério de definição de ciência, uma teoria da pesquisa científica que viabiliza a escolha de um método; tal escolha remete ao critério de demarcação, ou seja, à possibilidade de se examinar a falseabilidade dos enunciados por meio de regras. Desse modo, um “cientista genuíno” deve ser antidogmático, pois, (...) “na busca da realidade, talvez seja melhor começar pela crítica das crenças mais enraizadas.” [2]

O critério que define ciência então é: a teoria científica deve ser passível de refutação; “para ser científica, uma teoria precisa ser criticável ou falsificável empiricamente – isto é, precisa ser uma teoria que possa ter sua falsidade atestada por evidências, testes empíricos (...), se um enunciado não for logicamente falsificável dessa maneira, não poderá ser considerado científico.”[3] Portanto, ciência não é sinônimo de certeza, o conhecimento científico pode e deve ser submetido a refutações por ser hipotético.

Convém observar que uma teoria não perde o estatuto de científica após ser refutada, por mais que pareça absurdo um enunciado - tendo sua falsidade constatada - ser considerado científico. O mesmo não ocorre no caso da tautologia, ou de enunciados que não podem ser testados. A verdade ou falsidade da teoria é menos importante do que a possibilidade de ser testada e refutada. Dessa maneira, Popper condena a visão positivista do conhecimento científico. Não há verdade absoluta, não há certeza na ciência, tudo pode ser refutado.

Mas, a forma lógica do enunciado não garante que seja refutável, pois, pode ser que nunca seja testado e, com isso, mantido. Muita vez o pesquisador protege sua teoria com unhas e dentes, utilizando estratagemas diversos, por exemplo, apresentando uma proposição ad hoc a uma refutação possível. No entanto, reiterando o critério popperiano, para preservar o estatuto de ciência – e evitar a postura positivista com “a ideia de que a verdade está situada além da autoridade humana”[4] – a teoria deve manter sua condição de refutável.

A fórmula da pesquisa científica compreende, então, dos seguintes passos: a um problema abordado (1), uma solução hipotética é apresentada (2); e, para que seja válida – provisoriamente – essa solução é submetida a testes constantes (3). Se tal solução não passar em algum teste, outra hipótese é apresentada.

Por exemplo, o modelo descritivo do sistema solar, da União Astronômica Internacional (UAI), considerou Plutão como sendo o nono planeta, desde que foi descoberto, em 1930. Hipótese que prevaleceu até 1996, quando houve uma redefinição do termo “planeta”, por conta de inúmeros objetos descobertos em observações, e Plutão passou, então, a ser tratado com um planeta anão, em virtude de suas características. Embora essa decisão seja aceita pela comunidade científica, há pesquisadores que pretendem encontrar evidências que permitam manter o estatuto de Plutão como planeta, o que é possível, considerando essa visão de ciência de Popper.

O desenvolvimento da ciência resultaria do processo de tentativa e erro; hipóteses são propostas como solução de um problema e, após serem refutadas, são substituídas por novas e melhores hipóteses, mais resistentes aos testes. “O critério de falsificabilidade foi originalmente preconizado como um definidor de ciência que, paralelamente, definiria também um modelo de escolha entre teorias.”[5] O método de definição de ciência e de escolha de teorias não se restringe ao universo da pesquisa, conforme sugere Popper no belíssimo texto : “As origens do conhecimento e da ignorância.”, é abrangente a todas as situações da vida humana, nas relações sociais, na política. Implica numa atitude mais humilde - e crítica - de abrir mão de convicções diante de argumentos melhores.




[1] POPPER, Karl: “As origens do conhecimento e da ignorância.” In: Conjecturas e Refutações. Trad. Sérgio Bath. 2ª ed. Brasília, Universidade de Brasília, 1982. (Pensamento Científico, 1) p. 57.
[2] Idem, p. 34.
[3] TASSINARI, Ricardo Pereira e GUTIERRE, Jézio Hernani Bomfim: “Falsificacionismo”.
[4] POPPER, p. 58.
[5] TASSINARI e GUTIERRE: “Falsificacionismo”.