terça-feira, 1 de outubro de 2013

Don't Let Me Be misunderstood.

La no recôndito da radical raiz

Ou na flor da fina pele

Mama eu ouço, somente tua voz

Negra, guerreira, rainha grave

Olha os pelos arrepiados

Minha pele também é tambor

Couro curtido ao Sol das estepes

Vibra grave um tímpano

Enquanto o outro se desfaz....

Don't let me be misunderstood

sábado, 24 de agosto de 2013

Um beijo em duas faces

Como tu bem sabes...
Os olhos são portas, estradas para um sertão...

La, bem no fundo
Da tua boca dissimulas tua língua, delicada, afiada

Ai, ai de mim...

Cada pinta em tua face é uma pista,
Num quadro des-ilusão.

Só...

Quê frieza a tua mão revela?
Onde está teu sangue?
Na cabeça ou no coração?

Teu caminhar só por entre as gentes engana a solidão?
Teu rumo tem destino certo.

Finges-te de Alice, mas sois avessa a loucura.
Temes a perdição...

No fundo da toca te des-cobres.
Do outro lado do espelho tudo se inverte.
Beijas a outra face.

Teus olhos desencontram
Tua boca seca

No fundo tu caminhas triste.


sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Sobre encontros, tequilas e amnésias


Diz a lenda que em algumas pessoas o porre de Tequila causa amnésia.
Certo dia, um casal de amantes marcou um encontro regado a muita, mas muita, Tequila.
Bem, dizem que a arte imita a vida, neste caso, extraordinariamente, sucedeu como na lenda. No dia seguinte, ambos acordaram em suas respectivas casa, porém sem a menor lembrança do que havia lhes ocorrido na noite anterior.
Em função do esquecimento, repetiram seus encontros por um sem-número de vezes...
Os detalhes!
Ah... os detalhes desses encontros...
No íntimo de cada um dos amantes, restava uma vaga lembrança: a sensação intuitiva dos detalhes, dos muitos detalhes...
Mas as circunstâncias da vida são tantas... e, entre encontros e desencontros, perderam-se pelo mundo.
Enfim, os amantes, pseudo casal, tomaram em suas vidas rumos diferentes...
Um foi para o norte o outro para o sul – coisas que acontecem na vida das pessoas.
Apesar de passado muito tempo, sentiam inusitadamente uma imensa vontade de se embriagar; sentiam uma falta, um vazio, sabe-se lá de que...
O fato é que os porres de tequila, agora sós, apenas lhes causavam substanciosas ressacas, tremendas dores de cabeça. No fundo, permanecia aquela mesma sensação de vazio, de ausência.
Depois de muito ponderarem a respeito de suas profundas angustias, sobre a terrível sensação de ausência que lhes oprimia, resolveram novamente se encontrar...
Então, aquele que havia ido para o norte, retornou. Assim como o amante que havia ido para o sul.
O reencontro ocorreu no mesmo horário e no mesmo local em que durante anos se encontravam.
Finalmente voltaram a se encontrar!
Ambos confidenciaram sobre suas profundas angustias; as lancinantes sensações de ausência que sentiram.
Discutiram sobre a hipótese da amnésia provocada pelos porres de tequila e admitiram sua possível factibilidade.
Puseram-se então a recapitular em suas memórias cada passo de seus encontros passados. Cada gesto foi, meticulosamente, retomado pelas parcas memórias de cada um.
De repente, como um grande quebra cabeças, tudo foi se desvelando diante de suas consciências.
O que em princípio parecia uma enorme colcha de retalhos foi se revelando um belo tecido, rico de detalhes. Cada redescoberta era motivo de grande alegria para ambos.
Em dado momento, todo o ritual dos encontros passados havia sido refeito.
Momento que lhes ocorreu a grande iluminação...
Como de súbito, toda aquela sensação de angustia, de vazio, havia sido finalmente preenchida pelos vários fragmentos de uma memória compartilhada e que lhes reconstruiria todo o sentido, que lhes refaria todas os brancos das longas noites de embriagues alone.
Faltava em suas tequilas...
O sal e o limão.


By: Jairo de Sousa Melo

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Popper e o caráter hipotético do conhecimento científico


Popper e o caráter hipotético do conhecimento científico

“Acredito que valeria a pena tentar aprender algo sobre o mundo, mesmo que, ao fazé-lo, descobríssemos apenas que não sabemos muita coisa. Esse estado de ignorância conhecida poderia ajudar-nos, em muitas das nossas dificuldades. Vale a pena lembrar que, embora haja uma vasta diferença entre nós no que respeita aos fragmentos que conhecemos, somos todos iguais no infinito da nossa ignorância.”[1] Karl Popper


Além de oferecer mais conhecimento sobre a realidade, a ciência tem propiciado o desenvolvimento tecnológico e a produção de equipamentos que facilitam o modo de vida humano. Isso porque corresponde à vontade humana de saber cada vez mais sobre o mundo. Sendo assim, ciência sempre existiu. Mas, sua definição e consequente modo de produção de conhecimento passaram por muitas variações.

Diante da diversidade de teorias, aquela que é aceita costuma apresentar vantagens sobre as demais concorrentes. O problema então é: qual teoria científica deve ser escolhida? Como escolher?

Karl Popper apresentou um critério de definição de ciência, uma teoria da pesquisa científica que viabiliza a escolha de um método; tal escolha remete ao critério de demarcação, ou seja, à possibilidade de se examinar a falseabilidade dos enunciados por meio de regras. Desse modo, um “cientista genuíno” deve ser antidogmático, pois, (...) “na busca da realidade, talvez seja melhor começar pela crítica das crenças mais enraizadas.” [2]

O critério que define ciência então é: a teoria científica deve ser passível de refutação; “para ser científica, uma teoria precisa ser criticável ou falsificável empiricamente – isto é, precisa ser uma teoria que possa ter sua falsidade atestada por evidências, testes empíricos (...), se um enunciado não for logicamente falsificável dessa maneira, não poderá ser considerado científico.”[3] Portanto, ciência não é sinônimo de certeza, o conhecimento científico pode e deve ser submetido a refutações por ser hipotético.

Convém observar que uma teoria não perde o estatuto de científica após ser refutada, por mais que pareça absurdo um enunciado - tendo sua falsidade constatada - ser considerado científico. O mesmo não ocorre no caso da tautologia, ou de enunciados que não podem ser testados. A verdade ou falsidade da teoria é menos importante do que a possibilidade de ser testada e refutada. Dessa maneira, Popper condena a visão positivista do conhecimento científico. Não há verdade absoluta, não há certeza na ciência, tudo pode ser refutado.

Mas, a forma lógica do enunciado não garante que seja refutável, pois, pode ser que nunca seja testado e, com isso, mantido. Muita vez o pesquisador protege sua teoria com unhas e dentes, utilizando estratagemas diversos, por exemplo, apresentando uma proposição ad hoc a uma refutação possível. No entanto, reiterando o critério popperiano, para preservar o estatuto de ciência – e evitar a postura positivista com “a ideia de que a verdade está situada além da autoridade humana”[4] – a teoria deve manter sua condição de refutável.

A fórmula da pesquisa científica compreende, então, dos seguintes passos: a um problema abordado (1), uma solução hipotética é apresentada (2); e, para que seja válida – provisoriamente – essa solução é submetida a testes constantes (3). Se tal solução não passar em algum teste, outra hipótese é apresentada.

Por exemplo, o modelo descritivo do sistema solar, da União Astronômica Internacional (UAI), considerou Plutão como sendo o nono planeta, desde que foi descoberto, em 1930. Hipótese que prevaleceu até 1996, quando houve uma redefinição do termo “planeta”, por conta de inúmeros objetos descobertos em observações, e Plutão passou, então, a ser tratado com um planeta anão, em virtude de suas características. Embora essa decisão seja aceita pela comunidade científica, há pesquisadores que pretendem encontrar evidências que permitam manter o estatuto de Plutão como planeta, o que é possível, considerando essa visão de ciência de Popper.

O desenvolvimento da ciência resultaria do processo de tentativa e erro; hipóteses são propostas como solução de um problema e, após serem refutadas, são substituídas por novas e melhores hipóteses, mais resistentes aos testes. “O critério de falsificabilidade foi originalmente preconizado como um definidor de ciência que, paralelamente, definiria também um modelo de escolha entre teorias.”[5] O método de definição de ciência e de escolha de teorias não se restringe ao universo da pesquisa, conforme sugere Popper no belíssimo texto : “As origens do conhecimento e da ignorância.”, é abrangente a todas as situações da vida humana, nas relações sociais, na política. Implica numa atitude mais humilde - e crítica - de abrir mão de convicções diante de argumentos melhores.




[1] POPPER, Karl: “As origens do conhecimento e da ignorância.” In: Conjecturas e Refutações. Trad. Sérgio Bath. 2ª ed. Brasília, Universidade de Brasília, 1982. (Pensamento Científico, 1) p. 57.
[2] Idem, p. 34.
[3] TASSINARI, Ricardo Pereira e GUTIERRE, Jézio Hernani Bomfim: “Falsificacionismo”.
[4] POPPER, p. 58.
[5] TASSINARI e GUTIERRE: “Falsificacionismo”.

quinta-feira, 27 de junho de 2013


Conduta moral e sociedade

A conduta moral implica em compromisso com obrigações estabelecidas socialmente. Não as obrigações legais, pois a moral regula muitas práticas que não são tratadas pelas leis ordinárias, mas as obrigações que dependem das relações sociais (na dimensão moral) como referência para definir quais são os interesses individuais aceitáveis.

As relações morais resultam da junção de exigências morais, expectativas morais, sentimentos morais e atitudes morais que, combinadas, caracterizam a conduta moral.

Faz parte da vida moral o “direito” de condenação moral, que ocorre quando há descumprimento de convenções sociais que determinam o que é conduta condenável; conduta condenável, vista como proibida, implica em ameaça de punição. A ameaça de punição é uma necessidade para se evitar a conduta moralmente errada, que é interessante – atraente ao infrator – por resultar em algum benefício individual. Paradoxalmente, a prática do mal é um bem para o indivíduo, pois é desejável, do contrário, se fosse “algo sem nenhuma qualidade desejável, ninguém iria querer fazê-lo”.

A conduta moral recomendável é instituída por convenção e guarda estreita relação com o “contrato” firmado pelos indivíduos na formação da sociedade política. O conhecimento da conduta moral implica na percepção das atitudes morais e das exigências morais. A exigência de consideração, que enseja as atitudes morais, compreende as crenças: no direito de ser respeitado, de que quem é punido deve entender sua punição por desrespeito e de que as atitudes e os sentimentos morais possibilitam ajustar a conduta moral. A legitimidade da exigência moral depende da legitimidade do direito, cujo é estabelecido discursivamente, conforme a ideia de “sentença performativa”, de Austin, pois, dizer que um indivíduo tem o direito à exigência moral é o mesmo que descrever uma realidade produzida pelo discurso. Portanto, o fundamento da exigência moral é um acordo de aceitação de direitos e deveres morais.

A exigência moral tem o objetivo prático de contribuir à organização da sociedade, à convivência pacífica e harmoniosa ao estipular parâmetros de conduta moral. Cabe salientar que a avaliação da conduta moral varia conforme a relação que há entre quem avalia e quem é avaliado. Mas, o importante é que a culpa implica em responsabilização do agente moral, tendo em vista a alteração de seu comportamento ou mentalidade no futuro; e, para ter o efeito esperado, a ameaça de punição deve ser acompanhada de punição efetiva quando necessário.

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Que importância tem a arte para o ser humano?

Os românticos ingleses e alemães propuseram o conceito de autonomia da arte, ou seja, expressão livre da experiência humana, de acordo com os critérios de criatividade e originalidade. Essas ideias de originalidade e autonomia serviram de referência a gerações posteriores no questionamento da censura e de imposições de interesses alheios à experiência estética. Cabe observar que esse conceito de autonomia – na filosofia da arte – vale tanto para o processo de produção quanto de apreciação (crítica) da obra de arte; e que, para ser livre, independente, a arte não poderia ficar associada a critérios absolutos, a princípios pré-estabelecidos.

Posto isso, percebe-se que a arte possibilita o registro histórico das paixões humanas, do teísmo ou do ateísmo, das relações entre o ser humano e a natureza, das várias facetas da organização social, etc. Ou seja, a consideração estética - que consiste na atitude de contemplar o objeto (sua aparência) que, por sua vez, estimula a capacidade de concepção, apreensão; de modo que não se trata de mera percepção sensorial e sim de pensamento - possibilita um conhecimento sobre a experiência humana por intermédio do discurso que expressa o sentido humano da obra de arte.

A despeito da pretensão romântica, a arte já serviu de instrumento de manutenção do poder totalitário, por isso, já esteve bastante limitada. E esse é um indício da estreita ligação que há entre arte, sociedade e relações de poder.

As relações de poder no trabalho, na família, entre etnias, gêneros, etc., não raro encontram suporte no Estado para determinar a “realidade” para o indivíduo, que a assume sem questionar. Considerando que a produção artística é afetada pelas relações sociais e pela tecnologia, que contribui com os processos de produção e difusão da obra de arte, a arte pode, então, reproduzir – e assim reforçar – a visão de mundo, sob a tutela do poder político, do indivíduo, conforme esteja habituado a perceber por intermédio da “arte” consumida.

Mas, a arte também pode questionar o poder político que gera injustiça, fazendo valer – aparentemente – sua liberdade de expressão. A questão é que a arte – engajada - como um instrumento político revolucionário assume uma função que também limita a pretendida autonomia, por maior que seja o valor estético de sua produção, pois se torna também servil ao ficar atrelada a critérios alheios ao processo artístico.

Considerando a expressão “valor estético”, não sem esforço e concentração se percebe o quão descartável é a produção artística enquanto mercadoria, a serviço do lucro; quão sem sentido se torna, assim, outra vez, o conceito de autonomia. De forma conveniente os capitalistas inverteram o valor da atitude estética na relação entre arte e ócio na sociedade do consumo, da moda do efêmero. A experiência estética que se vende não estimula a capacidade de pensar e de conceber, pelo contrário, entorpece, aliena o público adestrado para panis et circencis.

A arte possibilita o exercício da humanidade. Na experiência estética o ser humano pode questionar essa sua condição humana ao pensar e sentir, estimulado pela apreciação da obra de arte. Basta dedicar um pouco de esforço e concentração para perceber a beleza por intermédio da atitude estética, que é o modo como se dá a relação entre o ato de apreensão e o objeto apreendido. Um aspecto que torna a atitude estética pouco popular é que interessa apenas a aparência momentânea das coisas e não as próprias coisas (realidade) – e suas funções – ou os sentimentos relacionados a essas coisas. Daí a ideia de que “a beleza é inútil, o que não quer dizer que não seja imprescindível.” (BARROS, M. B. “Da estética à filosofia da arte”) A experiência humana se torna edificante, enriquecedora, quando em contato com o belo, com seus “tesouros inestimáveis de beleza e sentido”. (BARROS, M. B. “Arte e Filosofia da arte no mundo contemporâneo”)

Ética: conhecimento e ação boa

Questões próprias ao estudo da ética – por exemplo, da relação entre consciência e responsabilidade - já apareceram nos textos do teatro clássico, mas, o tratamento teórico desse campo de estudo da filosofia teve início nos diálogos de Platão. Essas questões da ética na Antiguidade são uma referência ao estudo da ética sob um viés histórico, sobretudo considerando que foram apropriadas pela posteridade e abordaram problemas ainda atuais.

A despeito de uma tentativa de educar o jovem antigo com base nos modelos de comportamento de deuses e heróis, apresentados nas composições dos poetas do período arcaico, como Homero e Hesíodo, os gregos do século V a.C. vivenciaram na figura de Sócrates – protagonista nos diálogos aporéticos de Platão – um novo rumo no pensamento sobre a ética: o estudo da ação humana como critério de avaliação ética e a razão como meio de se estabelecer os paradigmas.

O que está em jogo na ética socrática dos diálogos é que o indivíduo deve ter controle das ações para que prevaleçam as ações boas, aquelas baseadas nas ideias. Para ter controle é preciso fazer valer a parte racional da alma (sobre a parte apetitiva), única capaz de distinguir verdade e aparência e orientar a ação, conforme o verdadeiro bem.

Embora haja dificuldade em se definir o “verdadeiro bem”, por conta da “aparente multiplicidade de bens”, é o conhecimento da verdade uma das formas perfeitas, das ideias, que possibilita a apresentação de um modelo ético platônico. Assim, considerando conhecer o bem como o conhecimento das ações boas, fica evidente a importância da educação para o conhecimento da verdade orientadora.

No modelo ético dos diálogos, o ser humano deve ser racional, buscar conhecimento, agir bem e, assim, viver bem.